domingo, 25 de dezembro de 2011

Amor



Quando me preocupo com minhas atitudes porque eu preciso ser um bom exemplo para minha filha... quando percebo que o que eu mais desejo é o bem estar dela... quando tenho a certeza que tudo o que de melhor pode me acontecer é a felicidade dela... quando penso nessas coisas, quando sinto o que senti agora ao escrever estas linhas, com os olhos marejados... o que sinto... isso é amor.
Minha mãe cuidou, por anos e anos, de meu avô, numa atitude de profunda entrega. Tudo o que ela fazia era pelo bem estar dele. O que eu via, naqueles momentos, nas atitudes de minha mãe, em seu sentir, em seus olhos... aquilo sim, um profundo amor.
Sensações intensas que após semanas acabam como se nada tivesse ocorrido. Prazeres de instantes que logo desaparecem. Revoluções de minutos. O ápice, depois o nada. Tais coisas passageiras, há quem as compare com o amor, mas são outros estes sentimentos, não o amor, certamente não. Gota diante do oceano.
Ele não a tem mais, então a odeia? Ela, que tanto o queria, agora que não pode mais tê-lo, então lhe quer mal? Não vejo amor no que sentem, ou sentiam. O amor e o ódio são opostos. O amor quer o bem, somente o bem.
Ah, o amor acabou? Se de fato acabou, eu creio, nem chegou a ser.
Uma das mais sublimes expressões do amor, o perdão.
Belíssimas verdades sobre o amor já estão escritas há uns dois mil anos, só que sou tão ignorante e teimoso, preciso de tempo para enfim começar a entender. Só estou começando, acho que estou.
O amor, belo, puro, este sentimento que nos aproxima de Deus, não pode ser transitório. É nisso que acredito.
O amor é eterno.
Deus é amor.






sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Cecília


Foto: Silvia Pinheiro


e eis que nesta manhã preguiçosa
tal aroma cruzou meu caminho
pétala alçada ao longe, há tanto
ainda assim perfumosa
alcançou-me em carinho
em encanto



domingo, 11 de dezembro de 2011

E daí?


Foto: Waldir C. Marinho


“Eu não entendo essas mulheres de hoje em dia, qualquer coisinha querem a separação, não insistem, não têm paciência. 
Eu hein, não cuidam mais dos maridos. 
Na minha época era diferente, imagina fazer naquela época isso que fazem hoje em dia. 
Tudo bem, todo mundo quer se sentir bem, é normal, mas é preciso ter mais companheirismo, mais tolerância. 
E olha que hoje elas tem tudo, tem tudo mesmo, muito mais que as mulheres tinham há anos atrás. 
Imagina se essas meninas de agora tivessem vivido na minha época. 
Eu não entendo, querem casar, depois logo querem separar, porque? 
Não gostavam dos maridos? 
Não diziam tanto que queriam casar? 
E depois não querem mais? 
É falta de amor, só pode ser falta de amor. 
Meu casamento dura há anos, há anos, e eu sou muito feliz. 
Não foi sem dificuldades, não pensem que foi fácil, mas valeu a pena, muito, e eu tenho consciência do quanto contribuí para dar certo. 
E olha que eu amo, e sei que tenho retorno. 
Às vezes fico quieta, sim, não vejo problema nisso, a gente precisa saber quando deve falar e quando não deve falar, para o bem de todos. 
O que me importa é que consegui construir isso tudo, meu lar, minha família. 
Posso até ser considerada submissa, talvez sim, e daí?”

Ouvi, respeitoso, o desabafo da distinta senhora.
Calei.

domingo, 20 de novembro de 2011

Mano


Foto: Waldir C. Marinho


Vejo-o passar rumo ao quintal dos fundos, onde armazena materiais que recebe, por doação, de diversas pessoas. Garrafas pet, metais, etc. Vai juntando aos poucos, recolhe, guarda, organiza. Depois de dias enche o carro com estes materiais e leva para vender e doar os valores obtidos à caridade, para a creche onde faz trabalho voluntário. Organiza jantares, almoços, eventos vários, trabalha nestes eventos, vende rifas, livros, tudo isso para angariar fundos para a creche. Entra em contato com os sócios que contribuem com valores mensais, que por vezes esquecem de seus compromissos assumidos, mas ele os procura e os lembra, sempre com paciência, sempre de forma cordial. Busca novos sócios. Faz essas e muitas outras tarefas para esta creche.
Trabalho infindo.
Só quem já teve contato direto com alguma entidade assistencial sabe das dificuldades em manter o trabalho, por falta de recursos financeiros. Refiro-me às entidades filantrópicas sérias, reais, que fazem jus ao título, como esta pequena creche onde ele é voluntário.
Além desse trabalho voluntário ele tem, é claro, atividade profissional como qualquer um, e seu trabalho é exaustivo. Não raro testemunho sua rotina sem horários fixos, trabalha em finais de semana, feriados, a qualquer hora do dia ou da noite o celular da empresa toca requisitando seus serviços. É bem comum ele virar a noite trabalhando, sua empresa o consome demais. E ele ainda consegue tempo e forças para continuar como voluntário na creche que comentei.
E para muito mais. Ele continua, além.
Está sempre disposto a ajudar. A todo mundo. Familiares, amigos, vizinhos. Conserta uma coisa aqui, instala um aparelho ali, dá carona a uma pessoa hoje, toma conta do filho de algum amigo amanhã.
Está sempre disponível para, com toda boa vontade, servir, apoiar, ajudar.
Quando vejo pessoas comentando que não estão com tempo para fazer uma ou outra coisa, ou quando eu mesmo penso desta forma, nestes momentos eu lembro dele, do quanto ele consegue fazer com o tempo que dispõe.
Uma pessoa muito especial, meu irmão.
Ele faz tanto e não espera retorno, não aguarda nada em troca. Faz isso tudo com resignação, sem reclamar, sem incomodar a ninguém. Nunca ouvi uma só queixa. Ele vai e faz, ajuda, sem fazer qualquer alarde. E ainda acha que faz pouco.
Meu irmão freqüentemente liga para mim só para me perguntar "como estão as coisas?". Escrevo estas linhas e me pergunto, quando terei eu feito o mesmo por ele? Nem lembro. Nem sei se já fiz. E pior, creio que nunca agradeci por isso. E como estas suas ligações inesperadas já me fizeram sentir melhor em momentos de dificuldades. Sou muito grato a ele por isso.
Tem sempre a oferecer uma palavra amiga, um sorriso. 

Enquanto muitos no entorno, eu incluído, discutimos sobre detalhes menores da vida, meu irmão vai lá e ajuda a quem precisa e pronto.
E há pessoas que desdenham do que ele faz, fazem piada. Mas ele não dá a mínima. Em vez de se preocupar com com o que dizem meu irmão continua, firme, em seu trabalho de doação.
Outro dia ouvi alguém, em favor dele, lamentar: "Ele é uma pessoa maravilhosa, ajuda a todo mundo, e ninguém dá valor, ninguém!"
Deus dá.




P.S: Quem quiser conhecer a creche que comentei, onde meu irmão é voluntário, basta clicar no link: http://www.crechenossolar.org.br/


domingo, 6 de novembro de 2011

Perdido


Foto: Mario Marinho


Estava tomando café na padaria próxima de minha casa, domingo de manhã, lendo um livro, uma das coisas que eu mais gosto de fazer.
Levantei o olhar, algum movimento me chamara a atenção. Havia um rapaz do lado de fora, no estacionamento em frente. Conversava com uma pessoa que passava. Percebi algo estranho no olhar do rapaz. Ele deu um passo adiante e pude ver um copo em sua mão. Cerveja.
Continuei em minha leitura, ao menos tentei.
Imaginei inicialmente que seria alguém voltando da "balada". Quando vou aos domingos na padaria, bem cedo, é comum encontrar adolescentes voltando das noitadas, por vezes bebendo. Mas não parecia ser o caso daquele rapaz, as roupas, a idade, uns trinta e cinco ou mais, não combinavam muito bem. Também não aparentava ser uma dessas pessoas viciadas em álcool que parecem passar mais tempo nos bares que em suas casas.
Olhei novamente, ele caminhava meio tonto, e falava muito. Nove horas da manhã e o rapaz bêbado.
Voltei ao livro e ao meu café.
Logo o rapaz entrou na padaria, pediu outra cerveja, e começou a conversar com alguns funcionários. Não consigo nem descrever direito o que ele falava, palavras desconexas, sem lógica. Olhar vago. Independentemente de sua atitude inconveniente ele era tratado pelos funcionários da padaria de forma cordial, parecia ser um cliente conhecido.
Depois fiquei sabendo que aquele era um cliente antigo, uma pessoa querida por todos, e o motivo daquela situação era que o rapaz havia acabado de se separar da mulher, e há dois dias estava por ali, bebendo.
Terminei o café, fui saindo e, no momento em que pagava comentei com o atendente do caixa se aquele rapaz não teria um familiar ou um amigo que pudesse levá-lo para a casa dele.
O atendente comentou: "Pois é, tem cara que é assim, fica ligado numa mesma mulher a vida toda, aí quando se separa fica desse jeito, perdido. É por isso que eu tenho várias, ontem mesmo saí com duas".
Fiquei me perguntando quem estaria mais perdido.



sábado, 15 de outubro de 2011

A meus mestres


Meus queridos.
Vera, Jorge, Célio, Roberto, Artêmia, Rinaldo, Afonso, Edilberto, tantos outros, no jardim de infância, colégio, faculdade, pós graduação, alguns dos quais nem lembro os nomes mas guardo imagens, ensinamentos, broncas, exemplos, sentimentos. Pessoas importantíssimas, fundamentais.
Tia Adi, inesquecível, se aqui escrevo é graças a você.
Muitos outros.
Meus professores de vida, principalmente meus pais, meus irmãos, familiares, amigos.
Tantas pessoas queridas, lindas, algumas já se foram, que me ensinaram, me ensinam, demais. A tentar ser mais cordial, mais generoso, mais ativo, mais forte, mais compreensivo. A ter mais paciência, a ser mais humano, mais irmão. A ser solidário, mais amigo. A buscar dominar meus medos, superar minhas deficiências, aprender com minhas falhas. A procurar errar menos. A acreditar mais em mim. A sentir mais gratidão. Ter mais religiosidade, mais fé. A perdoar. A continuar, mesmo diante de amarguras, a acreditar, no carinho, no compromisso, na fidelidade, na dedicação, na paixão. Na vida.
Minha filha linda, que me ensinou, de fato, o que é o amor.
Jesus, o maior de todos.
A todos meus grandes mestres, lamento pelos momentos em que demonstrei não ter aprendido direito, e agradeço por suas presenças marcantes em minha vida, por insistirem comigo, pelo tanto que fizeram por mim, e espero em Deus conseguir, em retorno a tantos ensinamentos, tantos exemplos, tanta doação, ser alguém merecedor.



sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Ele retornou




Passei a mão em seus cabelos, olhei para seu rosto. 
Seus olhos, com o passar do tempo, tornaram-se azuis. Assim me pareceu, um azul celestial, como a antecipar a aproximação do presente momento.
Beijei sua fronte, três vezes, e lhe sorri. Ele piscou uma vez e me dirigiu o olhar. Esta não foi a última vez que o vi, mas creio ter sido o último momento em que ele me percebeu, ali, em sua frente.
Por instantes, admirei seus olhos.
Tanta experiência, tanta sabedoria, naquele olhar.
Deus, em sua infinita generosidade, permitiu que ele estivesse entre nós por tantos anos.
Mas chegou a hora, e o anjinho retornou, para seu lugar.



segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Periferia


Foto: Mario Marinho


Regiões de pobreza, inúmeras, imensas, circundam ou entremeiam as grandes cidades. Miséria, favelas, tráfico de drogas, violência e outros tantos fatores associados fazem parte da realidade dos moradores desses locais. O que sabemos sobre estas pessoas, suas vidas, seu dia a dia? Creio que muito pouco. Dependendo do local em que se mora, onde se trabalha e se vive o dia a dia, é possível uma parcela da população não ter muito contato direto com as periferias. Isso ocorre em São Paulo, por exemplo, uma cidade com a característica de ter estas áreas de pobreza em maioria distantes da região central. Mas mesmo que não nos aproximemos destes locais com frequência sabemos que eles existem, pela mídia, pela internet, ou outros meios. Sendo assim, qual será o motivo do nosso desconhecimento acerca do que ocorre nestas regiões mais pobres? Será por não frequentarmos esses lugares, ou na verdade preferimos ignorar estas pessoas?

Bem, acho que esta resposta é algo próprio de cada um. Nós que vivemos em grandes centros e fazemos parte de uma classe com certo nível sócio-econômico, desfrutamos de realidades bem diferente de milhões de moradores de regiões periféricas e parece que não nos importamos muito com as vidas deles. Acredito que isso pode soar estranho ou injusto, mas tentando responder por mim assumo que, embora eu até demonstre me importar em uma ocasião ou outra, como através deste texto, reconheço que em geral eu vivo sem exercer qualquer ação efetiva para auxiliar estas pessoas e até sem pensar muito nelas. Desconheço muito do que de fato ocorre na periferia e pouco contribuo, sendo assim é como se eu a ignorasse, ao menos em grande parte do tempo. Essa é a minha resposta, sincera, cada um tem a sua.

Vivendo no centro, levamos nossas vidas sem nos importar muito com estas pessoas, ou sem fazer muita coisa por elas, quase como se a periferia não existisse. Estou usando a palavra "periferia" como sinônimo, ou símbolo, de algo que pouco conhecemos, sendo a miséria, o crime, a violência, parte disto. Uma difícil realidade que, por vezes, nos alcança. Tantos problemas, tamanho desequilíbrio, acaba por extravasar, romper os limites do gueto, talvez seja inevitável que isso aconteça. E é nestes momentos que a periferia chega ao centro, chega até nós.

Continuamos a ignorar a periferia até que esta, de repente, nos aparece.

Por exemplo, quando num semáforo uma criança maltrapilha nos pede esmola. Seria mais simples olhar para a frente e, enfatizando nosso descaso, aumentar o som do carro, evitando a consciência daquela pessoa ali ao lado, mas isso não é possível. Sim, pois sentimos pena, ou medo. Ali somos obrigados a entrar em contato direto com a periferia, que por vezes até bate no vidro do carro para chamar nossa atenção. Podemos continuar com a janela fechada até a luz verde acender, mas não adianta pois já está feito, fomos alcançados, incomodados, invadidos em nossa zona de segurança. Percebemos que temos muito mais condições de vida que aquela pessoa ali ao lado, que não tem quase nada, e isso nos envergonha. A alguns de nós, ao menos, envergonha. Mas o máximo que fazemos é dar uns trocados, torcendo para que este contato seja breve, e aí depois arrancamos com o carro para o mais rápido possível esquecermos novamente a periferia. Até que ela nos alcance novamente, no próximo semáforo, numa das esquinas da vida.

Caro irmão, cara irmã, está cada vez mais difícil ignorar a periferia, não é mesmo? Você já foi assaltado? Já lhe apontaram uma arma, um revólver? Espero que não. A mim já apontaram mais de uma vez.

E qual é a solução? Quem sou eu para afirmar algo a este respeito. Ações sociais, investimento em educação, cultura, esporte, lazer, inclusão, combate à criminalidade, maior distribuição de renda, redução das desigualdades sociais, entendo que tudo isso faz parte da solução e já vem sendo feito. Mas certamente é preciso mais, muito mais.

É preciso ajudar, sim, e acho que este auxílio, que não me parece simples de efetuar, deve ser feito através de uma real compreensão da periferia, esta precisa ser ouvida e sinceramente entendida. Ser aceita, abraçada. Ao arrancarmos com o carro no semáforo estamos caminhando na direção oposta, fingindo não ver o problema até a próxima vez em que a periferia transbordar novamente, o que pode acontecer logo ali adiante. Seres humanos, pessoas iguais a nós, que estão sofrendo, passando necessidades, precisam ser amparados, não podemos continuar a lembrar da periferia apenas quando esta nos alcança em situações que nos são incômodas, essa é uma atitude egoísta que só mantém o problema, em prejuízo de todos.

Fico imaginando, e se ampliarmos o contexto, considerando o mundo inteiro, qual seria a periferia do mundo? Existe isso, a periferia do mundo? E qual seria o centro? Bem, existem países imersos em grande pobreza, desequilíbrio social, guerras, conflitos internos, contrastando com outros países da mais absoluta riqueza e prosperidade, certamente há vários representantes dos dois lados. Se pudéssemos eleger uma capital mundial esta seria representada, acredito, pelos Estados Unidos da América.

Na minha opinião o dia 11 de setembro de 2001 foi um momento marcante em que a periferia do mundo extravasou, rompeu os limites periféricos, e alcançou o centro. Não há nada mais simbólico que o mais rico país do mundo ser quase que paralisado por um ato terrorista que apagou as luzes de uma das suas principais capitais. Mesmo com todo o seu poder econômico, político, bélico, a principal nação do planeta não conseguiu evitar ser alcançada pela periferia mundial. E a suposta solução que se seguiu, pálida, ineficaz, egoísta, a meu ver está longe de ser uma real solução: guerras, mais violência, a morte de Bin Laden, que já foi substituído por um outro que futuramente também assim o será.

Todos nós, das capitais do mundo, estamos tomando medidas para ajudar, aceitar, abraçar, compreender a periferia mundial?

Ou apenas estamos arrancando com o carro, rumo ao próximo semáforo?




Comentários adicionais:

Quem quiser conhecer mais da realidade nas regiões periféricas brasileiras, o crime e todos os fatores associados, indico os livros:
     - Falcão, meninos do tráfico (Mv Bill e Celso Athayde)
     - Cabeça de porco (Luiz Eduardo Soares, Mv Bill e Celso Athayde)
     - Abusado (Caco Barcelos)
     - Estação Carandiru (Drauzio Varela) 
     - Elite da Tropa 1 (Luiz Eduardo Soares, André Batista e Rodrigo Pimentel)
     - Elite da Tropa 2 (Luiz Eduardo Soares, Cláudio Ferraz, André Batista e Rodrigo Pimentel)

Para quem tem interesse em saber mais sobre a vida nos países árabes, muçulmanos, cultura, religião, conflitos, detalhes sobre o fundamentalismo islâmico e outras questões, indico os livros abaixo:
    - O vulto das torres (Lawrence Wright)
    - O livreiro de Cabul (Asne Seierstad)
    - 101 dias em Bagdá (Asne Seierstad)
    - O caçador de pipas (Khaled Hosseini)
    - A cidade do sol (Khaled Hosseini)
    - Filho do Hamas (Mosab Hassan Yousef, com Ron Brackin)


*Entendo que este texto foi influenciado pelos livros citados acima.




segunda-feira, 12 de setembro de 2011

O menino da AACD


Foto: Melissa Marinho


Neste dia foi diferente, o ambiente que normalmente era apinhado de pessoas estava vazio. Ainda assim sentei à mesa para desfrutar meu café, como de hábito, observando o local em silêncio. Estava no saguão de entrada, na cafeteria que fica junto à recepção da AACD do Ibirapuera, São Paulo. Somente a atendente que servira o meu café me fazia companhia.

Vocês certamente conhecem a AACD, uma instituição filantrópica de apoio a crianças deficientes, muito tradicional, ativa e séria, presente em diversos estados. Para conhecer mais basta usar o link: www.aacd.org.br

Tenho um cliente na cidade de São Paulo, um hospital, que fica ao lado de uma das sedes da AACD, esta no Ibirapuera. Lá nesta sede tem um estacionamento rotativo aberto ao público, e sempre que vou visitar este hospital que citei eu deixo o carro no estacionamento da AACD. Comecei a usar o estacionamento deles, há anos, porque era a única opção para deixar o meu carro no local, uma região muito movimentada e sem outras opções. Hoje faço isso por outros motivos. Acredito que a arrecadação com aquele estacionamento deve ser importante para eles, e lá também há uma loja com diversos produtos da AACD, chaveiros, camisetas, que por vezes compro para ajudar. 

Mas há um outro motivo importante para eu sempre passar por lá. Quando eu retorno da visita ao cliente, antes de pegar meu carro, costumo tomar um café na cafeteria junto à recepção e ao fazer isso fico sentado, por alguns minutos, olhando para aquelas pessoas. Um ir e vir muito grande, crianças com necessidades especiais, suas mães e irmãos as acompanhando, trabalhadores, voluntários, muita gente. Gosto de fazer isso, propositadamente, para repensar minha vida, para pôr os pés no chão e lembrar que eu tenho que agradecer muito a Deus. Naqueles instantes, enquanto tomo meu café, eu vejo com clareza que meus problemas são mínimos. Diante da realidade daquelas pessoas tenho até vergonha dos meus problemas, supostos problemas, assim me parecem enquanto permaneço ali naquele local.

Naquele dia em especial foi interessante, eu quase esquecera de tomar o café como sempre faço e já estava indo pegar meu carro, quando lembrei. Eu não estava num dia muito bom, meio sem paciência, um tanto triste, quase desisti da idéia de tomar o café mas... a cobrança interna por aquele meu compromisso íntimo falou mais alto, a consciência pesou, e voltei. Mas por algum motivo, talvez pelo horário já no fim da tarde, não havia ninguém, a recepção da AACD estava vazia. De qualquer forma pedi meu café e fui tomá-lo sentado a uma das mesas do local. Fiquei ali por uns instantes, achando que iria embora sem ter contato com mais ninguém.

Mas aí em dado momento um dos elevadores próximos chegou ao térreo, a porta abriu, e saiu um menino, uma das crianças atendidas. Saiu correndo do elevador, apressado, em sua cadeira de rodas.

Enquanto o menino rumava rápido em direção ao balcão da cafeteria para escolher seu lanche uma coisa me chamou muito a atenção. Não, não foi o fato de ele usar uma cadeira de rodas, não foi a sua situação. Também não foi pena o que senti ao ver o menino, não foi compaixão. O que mais chamou a atenção naquele menino foi o seu sorriso. Ele, em sua cadeira de rodas, com lá seus 12 anos, e um sorriso lindo, contagiante.

Fiquei de início um pouco envergonhado, sim, ao ver aquela criança com tamanha alegria de viver e eu acabrunhado no meu canto. Mas aos poucos fui ficando feliz também, por ele, com ele. Aquela situação me tocou, observei a alegria de viver daquele menino, uma alegria muito intensa, ele nem parecia ter problemas. O menino e sua mãe pegaram o lanche e saíram pelo corredor, sumindo de vista.

E eu fiquei, sentindo uma grande gratidão porque aquele menino, que talvez nem me tenha notado ali sentado, mas que com seu sorriso, com sua alegria, transformou o meu dia.




quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Ela é demais


Foto: Waldir C. Marinho


Ela é inteligente, espirituosa, alegre, divertida.
Damos muitas risadas juntos.
Com ela converso sobre música, futebol, filosofia, sobre um monte de coisa.
Ela tem uma visão parecida com a minha sobre religião e religiosidade.
Eu e ela vemos o mundo de forma semelhante.
Ela gosta muito de ler, eu também, conversamos bastante sobre literatura, adoramos visitar livrarias e ver as novidades.
Nós dois gostamos de diversas coisas em comum.
O tipo de filme que ela mais gosta é drama, outro dia conversamos a respeito e eu acabei chegando à conclusão que essa também é minha primeira opção.
Ela se interessa por política e eu também, mas eu estava meio afastado, só que ela está me fazendo pensar diferente e voltar a me interessar e a cobrar de mim mesmo uma postura política mais atuante.
Eu adoro estar na companhia dela, muito mesmo.
No último domingo ao vê-la do outro lado da rua esperando para atravessar e encontrar comigo, com um presente na mão para me dar, eu não resisti e as lágrimas rolaram. 
Acho que ela nem viu, eu enxuguei o rosto e quando ela se aproximou de mim eu procurei disfarçar a emoção.
Ela tem 12 anos, e eu a amo.



domingo, 7 de agosto de 2011

Dom


Foto: Tatiana Girotto


nascente
fértil
brota
pinga
corrente
flui
batiza
irriga
leva
corre
vai

o chão
infiltra
habita
aduba
germina
cria
sacia
ajuda
das nuvens
nasce
cai

na pele
emana
limpa
banha
o que ora
n'alma
aflige
arranha
acalma
foge
sai

dos olhos
morna
escorre
filtra
a dor
no peito
amarga
aflita
transforma
morre
esvai

sutil
matéria
leve
pura
é vida
mar
beleza
cura
milagre
dom
do Pai



domingo, 17 de julho de 2011

Sem burocracia!


Foto: Waldir C. Marinho


Estava eu num restaurante japonês ali na Av. Brig. Faria Lima, São Paulo. Meu sunomono tinha acabado de chegar, delícia.
Então sentaram umas meninas na mesa de trás, tagarelando. Bem, na verdade era quase um monólogo, eu ouvia muito mais a voz de apenas uma delas, e ela falava sobre o namorado. E nossa, como a menina falava.
Chegou o shimeji, ótimo.
E a menina a falar. Bem, dizer que apenas falava é simplificar a coisa, ela parecia tentar descrever uma espécie de mapa da alma do namorado dela, algo assim. Rs. Coitado. O namorado dela isso, o namorado dela aquilo, etc. A orelha do rapaz nem devia mais estar vermelha, como dizem, devia estar roxa, rsrs, de tanto que a menina falava dele.
O garçom trouxe meu temaki skin, com molho tarê, oba.
Tem gente que não sei como consegue comer de tanto que fala no restaurante, era o caso da menina. Se ela tivesse mais idade eu diria que era psicóloga, psiquiatra, terapeuta, vidente, sei lá o que, ela enxergava tanta coisa nas atitudes do namorado, que o cara não se importava com ela porque outro dia ele demonstrou certo “ar” de nem sei bem o que diante de uma situação, ela viu na expressão dele, etc.
Humm, adoro todos os sushis com salmão skin, com bastante tarê, ou teriaki, como queiram. Chegou um monte, delícia.
Eu comendo, a menina falando. Rs. E ela tinha certeza que o namorado ainda sentia alguma coisa pela ex namorada dele, porque ela viu que ele apresentou uma reação tal diante de alguma coisa que eles viram numa livraria, num shopping, caramba como essa menina conseguia enxergar aquilo tudo? Fiquei imaginando ela e o namorado juntos, será que ela tagarelava assim com ele, ou faziam outras coisas também? Rsrs.
Outro temaki, de Salmão, adoro.
E a menina dizia que percebeu alguma coisa, que nem lembro bem, num simples olhar que o namorado deu para a mãe dela, ei minha filha deixa o cara ser feliz! Seja feliz você também! Fiquei com pena do rapaz sem nem conhecê-lo, imaginei, rindo, se ele tinha a mínima idéia de como a namorada dele o examinava, analisava, dissecava, sei lá como descrever aquilo. E ainda contava tudo para a amiga dela. Rsrs.
Chegaram os sashimis, todos de salmão, claro, que beleza.
Do jeito que a menina conduzia o “diálogo” com a amiga imagino como seria uma conversa com o namorado. Em dado momento eu me vi já torcendo para o rapaz se livrar daquela verdadeira mala, rsrs. A menina falava do namorado de uma forma, coitada dela também, mas como tem gente que gosta de complicar as coisas. Todo mundo está nesta vida no mesmo barco, com dificuldades, problemas, prazeres, alegrias, vamos simplificar mais as coisas gente! Era até difícil pensar em outros assuntos, meus pensamentos eram conduzidos pela conversa da mesa de trás. Rs. Pedi a conta, paguei, fui embora, e a menina continuou lá, falando, falando, falando.

Ah, por favor, eu não tenho vocação pra ser tema de tese de mestrado! Minha linda, vem aqui dar um cheiro, deixa eu te apertar forte, agora! Sem burocracia, quero que me ame, pô!



quarta-feira, 6 de julho de 2011

Tia linda


Foto: Waldir C. Marinho


Oi tia linda.
Lembra que eu te chamava assim, tia linda? Cheguei a te deixar algumas mensagens no Orkut desta forma. Rs. 
Lembrei agora que fui eu que criei o seu perfil. Com aquela coisa toda de separação, minha, sua também, isso foi há uns dois anos, resolvi criar um perfil pra mim no Orkut e fiz um pra você também.
Nossa, as lembranças são muitas.
Pois é, tia, eu acordei hoje com uma sensação muito estranha, aí resolvi te escrever. Foi agorinha mesmo, meu celular me acordou, bem cedo, me avisando que hoje é uma data muito especial. Estava lá escrito na agenda do celular, apareceu na tela pra me lembrar. Nunca tive uma sensação assim antes.
Fiquei triste. Aliás estou agora mesmo segurando as lágrimas. Desculpe, tia, mas é assim mesmo, creio.
Está tudo bem contigo, tia? Espero que sim.
Não te chamava de tia linda à toa, sabe, nem sei se você tinha noção na época. Nossa, linda mesmo.
Sabe um dos momentos que mais gosto de lembrar? Quando nós saímos à noite, naquele bar na Lapa. Eu, você e a prima, os três em meio a processos de separação. Foi a primeira vez que eu saí depois de ficar solteiro novamente, você praticamente me convocou. Rs. Nós rimos muito, muito mesmo. Parecia uma noite de caça às bruxas. Rsrs. Foi uma noite inesquecível.
Saudades, tia.
Vai ser difícil ficar sem pensar em você hoje.
Foi muita dor, agora percebo, tia, muita dor, não é mesmo? Ninguém percebeu isso. Aliás acho que algumas pessoas até perceberam, mas ninguém talvez tenha te compreendido totalmente. Refletindo sobre aqueles dias, penso que eu poderia ter te compreendido mais. Acho que eu seria capaz disso, acho até que te entendia bastante. Mas do que adianta agora pensar nisso, se na época não me aproximei? Se não tentei te ajudar? Se priorizei outras coisas? A vida, a rotina. Fui egoísta.
Eu lamento, tia, lamento muito.
Você só precisava de amor. Só de amor. 
Agora as lágrimas caem mesmo.
A coisa mais estranha foi apagar seu perfil no Orkut. Eu não queria fazer isso, foi difícil, mas eu tinha que fazer, claro. Parecia que eu estava te apagando. E depois ficou aquele lugar vazio entre os meus amigos, foi estranho demais.
São muitas lembranças, de todo tipo. 
Momentos de alegria, você por vezes sabia como fazer a gente dar risadas, rs, é bom lembrar desses momentos.
O que me alivia é que Jesus está cuidando muito bem de você, com todo carinho, sei disso.
E que agora você está num lugar melhor.
Um lugar mais bonito, com mais paz, mais feliz. 
Tenho certeza.
Um grande beijo tia.
Feliz aniversário.




P.S: A forma com que escrevi este texto entendo ter sido influenciada ou, como diriam alguns, inspirada, pelos textos da Larissa Miranda, em especial o texto "Da sessão: cartas #2" que vocês podem ler em http://maisamorporfavor.blogspot.com/2010/10/da-sessao-cartas-2.htmlA Larissa é uma blogueira gaúcha de 19 anos, eu adoro os textos dela, sempre impregnados de grande emoção. Não deixem de visitar o blog da Larissa, vão gostar.


quinta-feira, 30 de junho de 2011

Luz do homem, luz de Deus



Foto: Tatiana Girotto


Saí de São Paulo em direção a Bauru, no fim da tarde. Antes de anoitecer, na estrada, quando a quase noite estava para deixar de ser, e o claro azul se transformava em breu, vi que esta noite seria sem nuvens, e ansiei pela lua como companheira de viagem. Eis que a noite veio, e eu no meio do caminho, mas nada da lua. Aos poucos pude ver uma e outra estrela aparecer. Então eu, sozinho, comecei a procurar estrelas. Aos poucos elas foram aparecendo. Eu dirigia e olhava, para a estrada e o céu, a estrada e o céu. Castelo Branco totalmente às escuras, mas ainda com grande influência das luzes da cidade, e eu comecei a brincar de baixar o farol. Eu apaguei completamente o farol várias vezes. A escuridão que fica é a coisa mais linda. Pode parecer perigoso, mas eu fazia apenas por instantes e acendia os faróis novamente. Lindo. Não sei bem explicar a sensação de ver o nada à frente do carro.
A influência das luzes da cidade, luzes do homem, aos poucos foi enfraquecendo, e as estrelas começaram a ficar mais aparentes, lindas luzes de Deus. Mais e mais as estrelas ficavam mais evidentes, mas ainda assim um tanto pálidas, ao menos no início do caminho. Mas conforme fui distanciando da capital o céu passou a ter menos influência das luzes da cidade, começaram a rarear as construções à beira da estrada, e as luzes divinas foram ficando mais marcantes.
É incrível como as luzes do homem, quaisquer luzes humanas, seja uma lâmpada num poste solitário, seja um automóvel à distância, é incrível como estas luzes do homem podem ofuscar as luzes de Deus. As estrelas somem. Deve ser proposital isso, Deus avisando que só fazemos bobagens, sei lá, ou que não conseguimos reproduzir nem algo próximo, nem um mínimo de sua obra de amor. Devia ser proibido ao homem acender aquelas luzes na estrada, neste dia ao menos isso deveria ter sido proibido, ofuscar as luzes de Deus deve ser um pecado daqueles. Rs.
Em dado momento a estrada ficou vazia, sem luzes dos carros para atrapalhar, e coincidentemente não havia construções próximas. Apaguei os faróis, breu completo, mas a visão do céu através do vidro do carro era complicada, pensei em parar o carro, abrir a janela... mas logo apareceu novamente o homem e sua luz imperfeita e intrusa e ofuscou tudo de novo, uma carreta ousou iluminar a estrada. E mais uma carreta. E mais outra. E voltaram as construções à beira da estrada, iluminadas. Fiquei procurando as estrelas, novamente ofuscadas pelas luzes humanas. Carros que passavam, caminhões. E eu andando mais devagar, buscando um momento sem interferência das luzes humanas, e assim tentei por um bom trecho da viagem. Em certo momento parei num posto de combustível, em vão. Não adiantava, tudo iluminado, as luzes humanas atrapalhavam. Saí e voltei à estrada.
E eis que então, depois de mais algum tempo, aconteceu. Em um trecho da estrada não havia luzes de casas para atrapalhar, nenhuma construção à beira da estrada, nenhuma luz perdida até o horizonte, nenhum brilho de cidade ao longe, perfeito. Encontrei um local fácil para parar o carro, e parei. Encostei o carro no acostamento, liguei o alerta. À minha frente, a poucos metros, uma placa apontava a entrada para Barra bonita e uma outra cidade que não me lembro o nome. Alguns carros ainda passavam, luzes do homem que ainda persistiam, mas seria questão de tempo. E então após alguns minutos não havia mais nenhum carro, nem um, para atrapalhar.
Parado no acostamento, desliguei os faróis e o alerta do carro. Escuridão completa.
Saí do carro.
Olhei para o céu, observei a imensidão.
Por mais que eu já esperasse, ainda assim me surpreendi.
Que espetáculo, que espetáculo.
Luzes de Deus, luzes de Deus, incontáveis, infinitas, beleza indescritível. Profusão de luzes divinas a me inundar os sentidos.
Sei que por toda a viagem Deus me acompanhou, me guardou, me protegeu, olhou por mim.
Mas neste momento, aí fui eu que vi...
...vi Deus
Eu e o céu. Eu e Deus.
À beira da Castelo Branco, fiquei parado, olhando.
O céu da minha infância, aquele que eu havia esquecido, voltou lá do fundo da memória. Que lindo, que lindo, maravilhoso espetáculo. Já havia visto isso antes, somente tinha esquecido que tinha visto. Mas neste dia teve um significado especial.
Fiquei assim por alguns minutos...
E então apareceu um carro ao horizonte. 

E outro. 
E mais outro.
Em dado momento os carros ficaram bem freqüentes, e então resolvi sair daquele local, pois a luz do homem não me deixou mais em paz.
Lembro que liguei os faróis e o motor, entrei rápido com o carro pela estrada, e gritei comigo mesmo SER HUMANO, O QUE HÁ COM VOCÊ? OLHE PARA ESTE CÉU!




P.S.: Essa viagem aconteceu em maio de 2009.






domingo, 29 de maio de 2011

Campeã




Minha filha linda, a minha Mel, passou, aos 4 anos de idade, por uma delicada cirurgia, uma cirurgia cardíaca. É que ela nasceu com um problema no coração que foi diagnosticado desde os primeiros dias de vida. Não apresentava sintomas aparentes mas exigia acompanhamento médico periódico, e como ela estava sempre ótima eu acreditava que continuaria a vida sem necessitar qualquer intervenção. Mas aí em uma consulta de rotina a cardiologista disse que uma cirurgia seria necessária. 

Imaginem. A família entrou numa espécie de colapso coletivo. Ao menos eu entrei, em silencioso colapso. Consultamos diversos especialistas na tentativa de uma opinião diferente, médicos de diferentes hospitais, de São Paulo, do Rio. Todos concordaram com o diagnóstico inicial, uma unanimidade. Os médicos diziam ser uma das mais simples e comuns cirurgias cardíacas. Eu tentava e até conseguia em parte compreender a argumentação estatística dos médicos, mas tratava-se da minha filhinha, de apenas 4 anos, e diante disso qualquer tentativa de pensamento racional é impossível.

Ansiedade total, preocupação, escolha de hospital, de médicos, acerto dos detalhes finais, e enfim chegou o dia da cirurgia. Lembro de um momento especial, a entrada da minha filha no centro cirúrgico. Já sentindo os primeiros efeitos do anestésico a Mel começou a rir, a dar gargalhadas mesmo. Ela nos olhava e ria. Foi embora nos braços do enfermeiro dando risadas e adormecendo aos poucos. Essa foi a última visão que tivemos dela antes da cirurgia. Ela foi e nós ficamos. Ela sorrindo, nós chorando. Deixamos o amor de nossas vidas nas mãos daquelas pessoas, médicos, enfermeiras. Nas mãos de Deus.

A espera foi muito difícil, cerca de sete horas de cirurgia, longas horas, emoção profunda, peitos abertos, de todos nós. No fim deu tudo certo, a cirurgia foi um sucesso, mas não sem muita luta. Luta intensa da guerreira menina.

Minha filha e os atletas tem algo em comum. Vemos nos jogos olímpicos os competidores e seus dificílimos desafios, treinamentos sem fim, dedicação, esforço, sofrimento, dificuldades várias. Mas ao alcançar êxito na competição máxima a emoção, o choro, a festa, e a recompensa. A vitória, representada pela medalha colocada no peito. A medalha é a prova da vitória, exposta com orgulho no peito do atleta.

Naqueles dias que agora recordo, quando minha filhinha passou pela cirurgia, aconteceu também assim, como nas Olimpíadas. Na competição de minha filha teve de tudo, superação, esforço, ansiedade, lágrimas, e muita torcida.

Há vencedores que apresentam suas medalhas de uma forma toda especial, é o caso de minha filha. Até hoje ela leva no peito a prova da sua luta, uma suave linha, tênue marca, quase não se nota, mas está lá, no peito da minha atleta. Esta cicatriz é a sua medalha. Sim, pois minha filha venceu, chegou em primeiro lugar, ela foi campeã. Já se foram quase dez anos e graças à cirurgia minha linda está curada, totalmente saudável. E sabe quem colocou esta linda medalha no peito da minha Mel? Foi Deus.

Seres iluminados, todos, todas as pessoas que nos atenderam e que cuidaram da minha Mel. Médicos, enfermeiros, cirurgiões, demais profissionais, pessoas do bem, especiais, abençoadas.

Outro dia aconteceu algo interessante. Na ocasião da cirurgia da Mel diversas pessoas, amigos, familiares, que foram visitá-la no hospital, deixaram recados para ela em pequenos bilhetes, inclusive eu deixei um. Eu nem lembrava bem do texto deste bilhete que eu deixei, e aí há pouco tempo eu encontrei este recado.

“Querida Mel.
Eu realmente não esperava que com apenas

4 anos você pudesse me ensinar tanto !
Eu te amo, e lhe desejo tudo de bom, saúde,

e uma vida longa e doce como você.
Papai.”


Menina, guerreira, atleta, pequenina, gigante, vencedora, campeã.
Minha Mel, o grande amor da minha vida.
Tenho muito orgulho de ser o pai dela.


domingo, 8 de maio de 2011

Ei, você



Ei, você.
Você aí na minha frente.
Porque você age desta forma?
Não sabe que é preciso fazer o bem?
Então porque continua assim, errando tanto?
Sim, você aí, estou falando com você mesmo.

O que? Você não fez nada errado? Não fez, tem certeza? 
Não foi muito errado? Como assim não muito errado?
Ah, todos fazem? É errado, mas todos fazem? E isso torna o que fez correto? Ou você quer dizer que, já que todos erram, pode errar também? Não acha que seria melhor não errar?
Porque você insiste nisso, em pensar só em si mesmo?
Ah, então você pensa nos outros, é isso o que acha?
E aquilo que você fez outro dia mesmo, naquele dia você estava pensando nos outros? Esqueceu do que fez naquele dia? Lembrou? Ah, entendi, era uma pessoa que você nem conhecia, mas o fato de não conhecer a pessoa que prejudicou torna menos errado o que você fez?
Está querendo enganar a quem?
Pode até enganar outras pessoas, meu caro, mas não a você mesmo.
E certamente não pode enganar a Deus.
Fazer o bem, é o caminho, o único, e você sabe disso.
Sim, errar é humano, ok, mas acertar também é, e meu caro, saiba você, temos escolhas. Fazer o certo ou o errado é uma questão de escolhas, de escolher o certo ou escolher o errado. Não há meio termo.
Ah, tem coisas que são difíceis de avaliar, se são certas ou erradas?
Por vezes você fica na dúvida?
É fácil tirar a dúvida.
Não faça aos outros o que não gostaria que fizessem a você.
É simples, coloque-se no lugar da outra pessoa e terá a resposta. Foi Jesus quem disse isso. A resposta está em cada um de nós, a consciência do que é certo ou errado está em cada um de nós. Só precisamos dar ouvidos a ela.
Sim, e eu sei que você sabe muito bem disso.
Você aí, porque está desviando o olhar? Olhe pra mim.
Você sabe muito bem de tudo isso, então continua errando porque? Porque?
Está com medo de me encarar, de olhar nos meus olhos? Tem vergonha do que tem feito?
Há pessoas que dependem de você.
Das suas ações, do seu exemplo.
Você precisa ser uma pessoa de caráter.
Você precisa honrar os ensinamentos e o bom exemplo dados por seus pais.
Você precisa ser um bom exemplo para sua filha.
Isso é o mais importante de tudo.
Mais que tudo.
Que tudo.
Após momentos de reflexão, a figura em minha frente, aos poucos, cria coragem e ergue a cabeça.
Levanta o olhar.
Olho em seus olhos, nos meus próprios olhos, no reflexo, no espelho.
40 anos, humano, falível, mas com a consciência plena de que tenho escolhas.
E que devo optar pelas corretas.
Se eu errei, a partir de agora acertarei, prometo a mim mesmo. Se acontecer o erro será na busca plena do acerto, sem hipocrisia, sem enganos.
Tenho a chance, a cada dia, a cada instante, de acertar.
De fazer o correto.
Que eu faça então a partir deste exato momento.
Deus espera isso de mim.
De todos nós.


sexta-feira, 22 de abril de 2011

Sorria


Ela tinha um sorriso lindo. Jovem, aparentava no máximo uns 18 anos. Muito simpática, em meio a sorrisos atendia a um rapaz na minha frente. Eu era o próximo na fila, aguardando para pagar meu café em uma loja de conveniência. Eles conversaram um pouco, papo animado. O rapaz foi embora, chegou minha vez. Quando ela começou a me atender fez uma expressão séria, parou de sorrir. Eu olhei para ela tentando entender o motivo, e aí resolvi pedir para mim também aquele seu sorriso. "Mas porque você parou de sorrir na minha vez? Sorria para mim também". Ela estranhou um pouco, mas logo respondeu, "É que achei que o senhor estava bravo, fez uma cara tão séria...". Pois é, nem sei quais preocupações passavam pela minha cabeça, mas o fato é que com minha expressão sisuda apaguei o sorriso da menina. Eu que reivindicava a simpatia para mim não oferecia o mesmo em troca. Claro que depois desta observação dela eu acabei ficando com a expressão mais leve e comecei a sorrir. E aí sim pude merecer receber em troca, enfim, o lindo sorriso da menina. Sorria!