sábado, 9 de novembro de 2013

Eternidade

Foto: Waldir C. Marinho

Estava eu à entrada de um cliente lá na capital do Piauí. Tratava-se de hospital público, era início da manhã e o local estava repleto, um entra e sai de pessoas, em maioria humildes. Abordou-me um rapaz cabeludo, vestes simples, provavelmente um morador de rua, nem sei. Pediu minha atenção de forma cortês mas um tanto na defensiva, e o curioso é que ele começou a contar uma história tão longa e complicada que ele mesmo se perdia nos detalhes. Seu jeito de contar era um pouco engraçado. Em dado momento, talvez por conta de minha expressão e meu sorriso, ele resolveu mudar o tom: "Bem, resumindo, estou precisando de ajuda". Não tive como conter um sorriso ainda mais franco. Perguntei o que precisava, ele disse que estava com fome. Havia uma lanchonete próxima e eu falei para ele escolher um lanche. Entrou na lanchonete, um pouco receoso, me apontando aos funcionários como que me usando como garantia para não ser expulso, coitado. Escolheu dois salgados enormes, gordurosos, e me perguntou humilde se podia pegar um refrigerante. Eu respondi, sorrindo, claro que sim. Ele pegou uma Fanta Laranja de um litro, rs, isso às oito da manhã. Paguei a conta, saímos da lanchonete e conversamos mais um pouco. Ele ficou tão feliz, eu também, ficou me explicando o quanto era maltratado, ninguém o ajudava, etc. Em certo momento perguntou se eu era doutor, rs. No final da nossa conversa ocorreu o fato mais marcante, ele, olhando em meu rosto, calmo, sério, disse estas palavras: "Quem sabe no futuro eu também possa te ajudar". Ele tinha barba e cabelos longos, lembrou-me Jesus. Olhei em seus olhos brilhantes, refleti, e vagarosamente assenti, pensando na eternidade.



sexta-feira, 18 de outubro de 2013

Efemeridades


Foto: Waldir C. Marinho

Um estalar de dedos, e fim. 
Efêmero, como a palavra já diz, pronto, passou. 
Acabou. 
Pelo suposto prazer de um único momento troca-se o respeito, a dignidade, o caráter, a família, troca-se uma vida.
Satisfação ilusória.
Sensações, apenas, inferiores. 
Desprezíveis.
Ínfimas.
Menores.
Finitas.
O que é eterno é trocado pelo presente instante, que passa, e nada resta. 
Aliás, resta sim, o remorso, a culpa.
Porque será que continuamos assim, preferindo o superficial, o passageiro?
Porque?
Porque não escolhemos a eternidade?
Eterna é a caridade. 
Eterna é a atitude de amparar um irmão. 
Ser eterno é abrir mão de si e ajudar a alguém.
Eterno é doar-se.
É perdoar.
É não esperar nada em retorno.
A eternidade está em respeitar a família, a esposa, o marido, os filhos, o pai, a mãe, o amigo, o irmão.
O próximo.
Ser eterno é resistir ao convite do erro, e persistir no bem.
Eterno é o amor.
É Deus. 
No entanto insistimos, continuamos preferindo, as meras efemeridades. 
Mas trata-se de uma escolha. 
Agora mesmo você pode fazer a sua. 
Eu também.




domingo, 29 de setembro de 2013

Felicidade


Foto: Vítor Thomaz

Vi outro dia numa novela uma cena que me deixou um tanto pensativo. Uma personagem comentava sobre uma amiga que já não era jovem e, ainda virgem, naquela noite estava com a perspectiva de ter sua primeira experiência sexual. Então a personagem, a respeito do fato inédito que poderia ocorrer com a tal amiga, falava algo do tipo: Neste momento fulana já pode ter tido sua primeira relação, agora mesmo ela já pode saber o que é ser feliz. Falou isso dando ênfase nas palavras 'ser feliz'. Segundo a ótica da personagem da novela, portanto, o sexo foi traduzido como sinônimo de felicidade, opinião que, creio, encontra eco em grande parte da audiência.

Quando eu testemunho alguma coisa deste tipo eu penso cá com meus botões, acho que nasci no mundo errado. Ou então nasci errado no mundo. Porque pra mim felicidade é uma coisa totalmente diferente. Tal tipo de comparação, para mim, é o mesmo que, sei lá, comparar pedra com água. Mas pensando bem, sendo totalmente sincero, quem sou eu para julgar aqueles que concordam com a opinião da personagem da novela, se me rendo a tais efemeridades, e as aprecio? Será por este motivo que a opinião da personagem tanto me tenha incomodado? Talvez. Nasci no lugar certo, e no tempo certo, então.

Mas é que nos meus pensamentos mais íntimos tenho opinião bem diversa, ser feliz pra mim é outra coisa. Para mim felicidade é algo próximo de ter... paz. Paz de espírito. É colocar a cabeça no travesseiro, tendo a consciência tranquila, e adormecer, em paz. Algo assim. Ser feliz é ter amor. É amar, incondicionalmente. É desfrutar de um poente silencioso e... calar... em devoção. É ter os olhos úmidos, quando em oração. Pra mim a felicidade real está associada à proximidade com o Pai, com Deus. Algo talvez utópico, ainda. Uma realidade da qual não faço parte na plenitude, não agora, tenho apenas vislumbres, breves, lindos, de tal sensação.

Certa vez li um texto a este respeito que muito me marcou. Esse texto considerava que, no nosso planeta, neste atual momento, a felicidade é algo praticamente impossível porque de fato nós não podemos realmente nos sentirmos felizes, verdadeiramente felizes, enquanto tivermos, ao nosso lado, um irmão que não é. Segundo o autor do texto, então, seria muito egoísmo, e seria algo falso, hipócrita, ilusório, alguém considerar-se plenamente feliz enquanto há pessoas no mundo ainda vivendo na miséria, passando necessidades, fome, doenças, enquanto há pessoas vivendo na mais profunda tristeza. Foi o que o autor do texto enfatizou. E, refletindo bastante, há muita lógica nisso, tenho que concordar. 

A felicidade completa, verdadeira, permanente, parece algo ainda a ser alcançado. Mas, um dia, acontecerá. Eu creio. Luz, divina, no horizonte.




sábado, 24 de agosto de 2013

Uma canção


Foto: Waldir C. Marinho


Primeiras notas de uma canção, antiga, tocante. Pegou-me de surpresa. Despertou-me expressivo silêncio. Algo inexplicável. Lembrou-me do que eu era quando a ouvia há muito, muito tempo. Não o que sou, mas o que deixei de ser, e a melodia me evoca este profundo sentir. O que a canção, em suaves tons, me retorna é outro alguém, outro eu, que ficou para trás. Há quantos anos, nem sei. Como posso ter deixado de ser? Garoto, isso o que eu era, um garoto. Mas onde estará este que se foi? Se perdido foi, como é que ora me retorna, me irrompe assim no peito e me extravasa os olhos? Quem agora chora, serei eu, ele? Será o garoto a me recordar o que fui, me resgatando em forte comoção, em meio a esta canção? Ah, pára, encerra, finda, não me traz este desconforto, esta saudade de mim mesmo. Como é possível sentir algo assim?

Ouço as notas da canção, que me promove esta revolução interior. Ah, o que fui! No que terei me tornado? Fujo do reflexo de agora, prefiro o garoto de outrora, ah, por favor, volte! Quero ser eu, você, novamente! Há tanto tempo... O tempo, o que me trouxe? O que? Muitas coisas, muitas. Inúmeros momentos, diversos, plurais, por todos estes anos, que me conduziram ao que sou, esse alguém cujo peito agora aperta em meio às notas do passado. Esta falta que agora sinto do que passou, por que será, o que terei perdido? Inocência, paz? Será isso o que a canção me faz sentir, falta de ser mais puro, mais leve? Falta de ser menos complexo, menos culpado? Falta de ser mais feliz?

A canção continua, saudosa e incômoda, mas... belíssima. Agora percebo, há também algumas notas, lindas notas, de esperança. Houve perdas, mas ganhos, inúmeros. Enfim, cresci. Amadureci. Envelheci. Aprendi. Passei por dissabores, mas sorrisos. Lágrimas melancólicas, e de alegria. Houve sofrer, mas amar. Adquiri marcas, físicas, e marcas n'alma. Pessoas conheci, caminhos trilhei, impressões deixei, tanto senti. Estarei melhor, agora? Pois sim, eu creio. 

Ah, a canção, que não pára, em meu peito. Por favor não pare! Ainda aqui está, o garoto, acaba de provar que nunca se foi, sempre esteve comigo. Mostrou-se e transbordou-me em pranto, através desta bela canção. As lágrimas são as mesmas, este ainda sou eu. Afinal o que serei, além desta singela, sensível, intensa, emoção? 




domingo, 21 de julho de 2013

Essência

Foto: Waldir C. Marinho

São inúmeras histórias, belíssimas, 
mas talvez você entenda que não é urgente lê-las todas.

São milhares de palavras, necessárias, 
mas pode ser que prefira escolher apenas uma.

São tantos personagens, importantes, 
mas quem sabe queira seguir o exemplo de um só.

Leia o evangelho. Escolha o amor. Siga a Jesus.




sexta-feira, 10 de maio de 2013

Simples solução


Foto: Tatiana Girotto


Ouvi falar que um sábio indiano disse certa vez que se todos os livros da humanidade fossem destruídos, e sobrasse apenas o Sermão da Montanha, ainda assim nada estaria perdido. Concordo com ele, o texto citado é parte importantíssima da Bíblia e lá estão alguns dos mais belos, e fundamentais, ensinamentos de Jesus. 

Tomo a liberdade de, seguindo esta idéia, simplificar mais. Quero escolher apenas uma frase.

Vivemos dias em que valorizamos demais detalhes fúteis, a cor da camisa que eu visto parece ser mais importante que a minha própria conduta moral. Perdemos tempo com discussões sem fim que não levam a quase nada, quando na verdade não conseguimos ainda cumprir a essência, que nos foi apresentada há mais de 2 mil anos.

Disse Jesus: "Amarás ao próximo como a ti mesmo". Quem sou eu para discordar dele. Devo fazer aos outros aquilo que gostaria que fizessem a mim, não devo fazer aos outros o que não gostaria que fizessem a mim. Simples assim, basta que todos nós obedeçamos ao que o mestre ensinou.

Na frase de Jesus a solução para todos os problemas do ser humano, absolutamente todos.




sexta-feira, 29 de março de 2013

Próximo alvo



Ouvi um som muito alto, parecia um acidente com automóvel. Não houve qualquer som de freada antes, somente a batida. Preocupado, fui até a janela do meu quarto, e vi a cena que se seguiu. Um carro havia acabado de bater em alguns outros que estavam estacionados. Pelo som e pela situação ficou claro que o motorista colidiu sem frear antes, talvez por ter cochilado ao volante, ou algum outro motivo. A batida foi muito forte, o carro devia estar em uma velocidade muito maior que o bom senso permitia em uma rua residencial como a minha. O motorista, um rapaz bem novo, saiu do carro um tanto desorientado e, aparentemente enraivecido, ao se aproximar de uma parede próxima, começou a esmurrar a parede aos gritos. Claramente estava bêbado. Havia acabado de amanhecer. Após cerca de meia hora ou mais apareceu um outro carro, de onde saiu um homem de uns cinquenta anos, o qual acredito que era o pai do garoto, que chegou para resolver as coisas, para salvar o filho daquela situação.

Lembrei deste fato, que testemunhei há meses atrás, ao acompanhar na mídia recentes casos de jovens que, dirigindo embriagados, atropelaram e mataram inocentes. Um caso em particular, horrível, impensável e desumano, ocorreu em São Paulo há poucos dias, quando um ciclista foi atropelado e mutilado por um automóvel cujo motorista, jovem e bêbado, além de fugir da cena, cometeu um outro ato que prefiro nem comentar aqui. Quem viu nos jornais sabe do que falo.

Fico imaginando, os carros destes jovens serão deles mesmos? Estes automóveis que matam tantos inocentes, conduzidos por adolescentes embriagados voltando das noitadas, serão deles ou serão emprestados pelos pais? Certamente são dos pais. E estes pais depois ainda vão acudir e livrar seus filhos, como eu vi no acidente próximo à minha casa, resolvendo a situação particular deles, mas comprometendo as vidas de outras pessoas, filhos de outros, as próximas vítimas. E quem sabe até emprestam novamente o carro no próximo fim de semana.

Qual será o calibre destas verdadeiras armas que certos pais irresponsáveis deixam nas mãos de seus filhinhos assassinos? Qual será o próximo alvo?




terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

Segredo


Foto: Waldir C. Marinho

vou te contar um segredo
saiba que existe um Deus
no qual não apenas acredito
mas sinto-o vivo
em tudo
em mim
em todos nós
e este Deus te sorri
quando percebe em ti sua essência
em uma palavra
amor




quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

Nova chance


Foto: Melissa Marinho

Continuo a caminhar, sem direção, sem conseguir compreender o que está à minha volta. Escuridão completa, sólida. Onde estou? Tento lembrar de como cheguei até aquele local, em meio a pensamentos desconexos. Consigo visualizar alguns contornos pálidos, acredito, mas que lugar seria esse? Estou sozinho e minha cabeça me atordoa, prossigo tentando caminhar no escuro, tateando às cegas, com receio de esbarrar em alguma coisa. Confusão em minha mente, cenas do passado me perseguem, nem sei bem diferenciar o que penso daquilo que vejo, se é que vejo realmente alguma coisa. Ouço algo? Sim, talvez, se assemelham a... sussurros. Posso estar imaginando coisas. Sigo, trôpego, em meio ao intenso negrume. De repente uma sensação diferente, alguém está ali, no escuro, a me espreitar. Quem é você? Tenho medo. Seja lá o que for, se aproxima. Tudo é escuridão. Aquela presença me provoca arrepios, me faz mal. Acelero meus passos, logo começo a correr. Não sei bem se chego a algum lugar de fato, mas continuo, corro e corro. Depois de algum tempo creio ter conseguido me desvencilhar daquela presença incômoda, paro de correr tentando perceber algum sinal do meu perseguidor. Terei eu sido realmente perseguido? Talvez não. De repente, a um palmo do meu ouvido, um grito estridente, arrepiante, ensurdecedor. Meu coração parece saltar do peito, nem me atrevo a olhar para o lado, fujo novamente como quem foge da morte. Tento chamar alguém, ninguém ouve. Socorro, socorro! Nem sei se grito ou é minha mente que me soa, me agride. Estarei enlouquecendo? Desespero, medo, perco a noção do tempo, pareço estar há horas nesta situação, ou seriam dias, meses? Minhas memórias me machucam, atos praticados, erros cometidos. Ouço ruídos, vozes, que me deixam apavorado. O que será isso? Medo, muito medo. Porque não consigo esquecer? Porque essas coisas me assaltam a mente? Sinto frio, dor, culpa. Quem são vocês? Quem está aí? Estão me acusando, serão as vozes ou a minha consciência? Ou é a mesma coisa? Minha cabeça parece a ponto de explodir em dor aguda. Tento fazer uma oração, é difícil, não consigo concatenar idéias, apenas confusão e angústia. Entre soluços, me ajoelho abruptamente, Jesus amado, perdão, perdão, perdão!

Algo mudou. Parece ter passado algum tempo. Silêncio. Imagens, sensações distantes, vagas, desaparecem rápido, por completo enfim. Teria eu sonhado? Não lembro. Um sentimento de leveza me inunda o peito. Respiro profundamente o ar puro que me preenche os pulmões, e a alma. Ao longe, passarinhos. Equilíbrio, paz. Com os olhos ainda fechados percebo uma mudança no ambiente, certa luminosidade toca meu rosto. Sinto a maciez do lençol a me afagar o corpo, confortável sensação. Abro meus olhos, aos poucos, para a suave luz nascente que me atinge, vinda da janela entreaberta do meu quarto. Independentemente de meus atos, nova chance me fora concedida. Uma lágrima solitária escorre, vagarosa, a refletir os primeiros raios de um novo dia.