sexta-feira, 17 de agosto de 2012

Goiabeira

Foto: Waldir C. Marinho


Eu subia na goiabeira muito rápido, conhecia os galhos certos onde me apoiar, em quais pôr os pés, as mãos, e logo chegava lá em cima, em segundos ia do chão ao céu. A árvore ficava no quintal dos fundos da casa de meus pais, onde vivi minha infância. Bem no alto havia um galho em curva, que funcionava certinho como uma espécie de cadeira, e eu, ainda bem pequenino, adorava ficar lá em cima ouvindo os sons, sentindo os cheiros, sensações, sentimentos, daquele meu mundo infantil, há mais de 30 anos atrás. Aquele local lá no alto da goiabeira era o meu cantinho particular. Eu adorava as goiabas "de vez", nem verdes nem maduras, hum, que delícia. A goiabeira era de goiaba vermelha, a mais suculenta e saborosa, eu comia lá em cima mesmo, sozinho, pensando na vida. Dos galhos da goiabeira eu conseguia alcançar o teto da garagem, e também o telhado da casa de minha avó. A árvore ficava entre a garagem e a casa, e os galhos mais altos ultrapassavam e cresciam por sobre as duas construções. Minha vó Maria morava há anos nesta sua casinha, atrás da casa de meus pais. Eu subia na goiabeira, pulava no teto da garagem, voltava para árvore novamente, de lá ia para o telhado da casa de minha avó, ia e voltava diversas vezes, adorava fazer isso. Do telhado da casa eu conseguia até subir em outra árvore, uma mangueira que ficava do outro lado, mas eu preferia a goiabeira, pois os galhos eram mais confiáveis, e lá eu tinha o meu lugar especial onde ficar. E também eu gostava mais de goiaba do que de manga, aliás até hoje eu prefiro as goiabas. Eu ficava lá em cima, no meu cantinho, em meio a meus pensamentos, preocupações e alegrias de criança. Minha avó, muito religiosa, costumava sentar no degrau da porta de entrada da casa dela para cantar as músicas favoritas da sua igreja. Eu e meus irmãos tivemos em nossa infância esta espécie de “trilha sonora”, minha vó e os cânticos de sua igreja, ela gostava muito de cantar e ficava lá na porta de sua casinha cantando por muito tempo, quase todos os dias. Por vezes ela me via lá em cima, no alto da goiabeira, e dizia: meu filho, desce daí, toma cuidado! Bons tempos aqueles.
Meus pais ainda moram no mesmo local, mas a goiabeira não está mais lá, há anos secou, morreu, e o tronco foi arrancado. A casinha da minha avó continua lá, hoje vazia.

Lembro disso tudo agora e é difícil descrever a sensação que me toma conta. Queria tudo de volta. Queria subir de novo naquela goiabeira apoiada na casinha da minha avó, agora mesmo, ficar um tempo naquele lugar que só eu conhecia e comer uma goiaba nem verde nem madura, “de vez”. Queria ouvir minha avó novamente cantando as músicas da igreja, sentada junto à porta da casinha dela. Nem que fosse por uns poucos minutos, queria muito ouvir minha vó Maria cantar novamente. A vida passa e a gente não se dá conta da importância destes momentos quando os vivemos, apenas depois, anos depois. Queria poder voltar no tempo.

Ah, acabei de me dar conta, voltei agora mesmo. Voltei no tempo ao escrever estas linhas, em meio a lágrimas, através desta inexplicável magia, a magia da saudade.